Dentre as diversas atividades da Semana do Servidor Público, a Mesa Redonda sobre a Reforma Administrativa e o Teletrabalho (PEC 32/2020 e IN 65/2020) reuniu colegas para debater os assuntos. Com a mediação de Loiva Chansis, Giovani Bortolini (assessor jurídico da ATENS/UFSM), Heverton Padilha (assessor jurídico da Assufsm) e Clóvis Senger (presidente da ATENS/UFSM) avaliaram as proposições da Reforma Administrativa e falaram rapidamente sobre o teletrabalho. A gravação pode ser assistida no Farol.
De acordo com Heverton, a IN65 é ilegal, pois as normativas servem para regulamentar o exercício de leis. No caso desta IN, não há lei que a embase, ela traz novos elementos, por isso seria ilegal. O advogado Giovani lembrou que o governo cortou vantagens de servidores com o teletrabalho e alardeou como redução de custos, porém não apresentou qual será o critério para medir a produtividade do teletrabalho. Somando-se ao debate, Clóvis lembrou que, durante o tempo em teletrabalho, foram feitos estudos sobre a saúde mental dos servidores e sua sensação diante do trabalho e surgiram muitos relatos de exaustão e desmobilização, que precisam ser levados em conta diante da IN65.
Estado subsidiário da iniciativa privada.
Relativamente à Reforma Administrativa, os debatedores apresentaram pareceres sobre artigos e princípios da PEC 32. Conforme Giovani, através desta e das reformas anteriores (previdenciária e trabalhista), o governo está tentando se eximir da responsabilidade pela população, contrariamente à Constituição Federal. “O que está na Constituição, embora não materializado, é o que é obrigação do Estado. Quando ele retira do texto constitucional, abre mão do compromisso de atender à população”, avalia Giovani.
Através dos princípios expressos na PEC 32 (legalidade, impessoalidade, imparcialidade, moralidade, publicidade, transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública, eficiência e subsidiariedade), o advogado Heverton apontou que o serviço público passa a ter condição acessória ao que será prestado pela iniciativa privada. A reforma também dá poderes ao Executivo de extinguir instituições, sem passar a discussão pelo Legislativo. Giovani lembrou do artigo 37 da PEC 32, que permite ao governo contratar empresas privadas para fins públicos, dando a estrutura governamental para tanto.
A PEC ainda dificulta o acesso a estabilidade e reduz a remuneração média no decorrer da carreira (retirando progressões por tempo de serviço, por exemplo), atingindo servidores federais, estaduais e municipais. “É importante ter consciência de que todos serão atingidos com a Reforma Administrativa, servidores públicos e população”, comentou Heverton.
A própria PEC 32 contraria seus próprios princípios no que diz respeito aos concursos públicos, quando exige apenas uma forma simples de ingresso, sem mais provas e exame de títulos. A reforma coloca outras formas de vínculo do servidor:
- Experiência: substituirá o estágio probatório e é uma condicionante para a posse, ou seja, ainda se é candidato durante o período de experiência
- Prazo determinado: poderão ser contratados a qualquer tempo de forma simples. Podem ser contratados em caso de greve, por exemplo;
- Prazo indeterminado: serão todos os servidores (TAEs, professores, jurídicos). O que ressalta Heverton é que uma das formas de perda do cargo (para os que ainda tiverem estabilidade), além dos já existentes, está “motivos a serem definidos por lei posterior”. Isso pode significar obsolescência da atividade, extinção do órgão, possibilidade de contratar pela iniciativa privada, etc.
- Funções de liderança: a Função Gratificada, que garantia que os servidores pudessem contribuir diretamente com a gestão pública, na PEC é substituída pela Função de Liderança, que poderá ser pessoas da iniciativa privada. “Essa figura, da FG, foi uma conquista dos servidores públicos”, lembrou Giovani.
Heverton lembrou ainda que os servidores não terão nenhuma indenização ao perderem o cargo, diferente do que acontece na iniciativa privada, quando se recebe FGTS, multa e demais valores. Essas mudanças, porém, não atingem alguns servidores públicos como juízes e militares. “É uma opção política desse governo não abarcar estes”, avaliou Heverton.
O que a PEC da Reforma Administrativa propõe, conforme avaliação dos advogados, é que o atual regime seja extinto. “O governo trabalha com a ideia de que os atuais servidores não serão atingidos, mas é uma inverdade, pois todos serão. Há uma clara ideia de extinguir o atual regime jurídico. Isso resulta para todos os servidores. Os aposentados, por exemplo, que hoje têm paridade, não terão, pois não haverá mais carreira à qual emparelhar e terminarão como os extintos ferroviários”, avaliou Giovani.
Para Heverton, a reforma vai vulnerabilizar o servidor público, dividindo em diversas categorias. “É a estratégia dividir para conquistar. Quem negociará reajustes?”, comentou.
População será a mais atingida
Clóvis trouxe, durante o debate, dados importantes sobre quem sairá perdendo com a reforma. De acordo com o IBGE, 71% da população depende exclusivamente do SUS para atendimento em saúde. Conforme o PNAD, mais de 80% dos estudantes de ensino médio e fundamental estão nas escolas públicas. O IPEA apontou que, de todos os servidores do executivo nas 3 esferas, 57% são municipais, sendo que 43% desses atuam na Educação e na Saúde.
Com a ideia de privatização que apresenta a reforma, “não é difícil ver que o prejuízo maior será para a população. Pensando na redução da jornada em 25%, por exemplo, será a diminuição de um servidor a cada quatro. Só isso já será um grande impacto para a população”, avaliou Clóvis.